A semana começa agitada em Santa Luzia! O Prefeito Paulo Henrique Paulino e Silva acaba de vetar integralmente a Proposição de Lei nº 079/2025, que visava alterar a Lei nº 4.647, de 20 de outubro de 2023, a qual institui a Loteria do Município de Santa Luzia – SLLOT. A decisão, publicada no Diário Oficial do Município (DOM) de 16 de julho de 2025, levanta sérias questões sobre a legalidade e a viabilidade da exploração de loterias por parte dos municípios brasileiros, trazendo à tona um debate que promete reverberar em toda a cidade.
O a nova lei da LOTERIA MUNICIPAL SANTA LUZIA veto, detalhado na Mensagem nº 040/2025 (documento 1292-DOM-ASSINADO.pdf), fundamenta-se em dois pilares principais: a inconstitucionalidade da proposta e a contrariedade ao interesse público. Para entender a profundidade dessa medida, é crucial mergulhar nos argumentos apresentados pela Prefeitura.
O Intrincado Cenário Jurídico: União, Estados e a Loteria Municipal
O cerne da questão reside na competência para explorar serviços lotéricos no Brasil. Historicamente, a União detinha o monopólio. No entanto, decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF), como as Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 492 e nº 493 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4986, modificaram esse cenário, declarando que o Decreto-Lei 204/1967 (que estabelecia a exclusividade da União) não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988.
Isso significa que os Estados e o Distrito Federal agora detêm competência material para explorar loterias em seus respectivos territórios. Contudo, e aqui reside o ponto nevrálgico, o STF não abarcou diretamente os Municípios nessa decisão. A Advocacia Geral da União (AGU) já se manifestou expressamente sobre o tema na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF de nº 1212, que ainda está em trâmite e tenta justamente impedir que municípios operem suas próprias loterias.
Segundo a Mensagem nº 040/2025:
“(…) Diferentemente do que suscitado nas informações das autoridades municipais requeridas, esse entendimento não implica uma extensão automática, aos municípios, da competência para a exploração de serviços dessa natureza (diretamente ou por meio de concessão). Isso porque a competência dos Estados-membros para explorar materialmente o serviço público de loterias decorre, residualmente, do regramento constante do artigo 25, § 1º, da Constituição Federal. Significa, portanto, que a exploração de tais serviços ocorre por exclusão, não se constituindo competência reservada privativamente à União, tampouco competência atribuída aos municípios. (…)”
Essa manifestação da AGU, citada no parecer que embasa o veto, é clara: não há, até o momento, amparo constitucional ou legal que fundamente a exploração de loterias pelos municípios. Isso gera uma enorme “insegurança jurídica”, uma vez que qualquer lei municipal sobre o tema estaria em terreno movediço, sujeita a contestações e a um eventual posicionamento contrário do STF, comprometendo os investimentos e a própria operação.
Detalhes da Proposta Vetada: Pontos de Inconstitucionalidade e Falhas Técnicas
Além da questão macro da competência, o veto do Prefeito aponta falhas específicas na Proposição de Lei nº 079/2025 que a tornam inconstitucional e contrárias ao interesse público.
- Exploração por Agentes Privados sem Licitação Explícita (Art. 1º): A proposição permitia a exploração da loteria por meios como parceria público-privada (PPP), concessão, permissão ou credenciamento. Ocorre que o STF, no Recurso Extraordinário (RE) 1.498.128, Tema 1.323 de Repercussão Geral, já definiu que “a execução do serviço público de loteria por agentes privados depende de delegação estatal precedida de licitação”. A redação proposta, por ser muito ampla e não mencionar a obrigatoriedade da licitação, contraria esse entendimento pacificado do Supremo, podendo gerar questionamentos e prejuízos ao erário.
- Competência para “Sistemas de Garantia” e “Modalidades Lotéricas” (Art. 3º): A lei vetada autorizava o Poder Executivo a “adotar os sistemas de garantia que julgar convenientes” e definir “todas as modalidades lotéricas, seja ela física ou eletrônica”. A Constituição Federal, em seu Art. 22, inciso XX, estabelece que compete privativamente à União legislar sobre “sistemas de consórcios e sorteios, inclusive loterias”. Dessa forma, o município não possui competência para definir esses aspectos de forma autônoma. Adicionalmente, o parecer aponta um erro gramatical na redação do artigo, o que poderia tornar sua interpretação confusa.
- Destinação de Imposto de Renda e Seguridade Social (Arts. 4º e 5º): A Proposição de Lei autorizava o Executivo a “disciplinar a forma da entrega dos valores destinados à seguridade social, ao imposto de renda incidente sobre a premiação”. No entanto, a competência para instituir impostos sobre a renda é privativa da União (Art. 153, III, da CF/88), e a organização do financiamento da seguridade social é matéria de competência federal, regulada por leis como a Lei Federal nº 13.756/2018. O município, portanto, não pode dispor sobre a forma de recolhimento ou destinação desses valores. Além disso, o Art. 5º autorizava a destinação do Imposto de Renda, o que também é competência privativa da União.
Antinomia e Falhas na Técnica Legislativa
Um ponto crucial levantado pelo veto é a falha na técnica legislativa da Proposição de Lei nº 079/2025. Embora a intenção fosse alterar a Lei nº 4.647/2023, apenas o seu Art. 1º era de fato alterador. Isso criaria uma “antinominia”, ou seja, uma contradição entre dispositivos da mesma lei, pois outras partes da lei original continuariam em vigor, mas estariam em conflito com as novas disposições ou com a intenção geral da proposta. Por exemplo, a lei atual determina que a loteria seria explorada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, enquanto a proposta vetada mencionava a Secretaria Municipal de Administração.
O veto também destaca a não observância das regras de técnica legislativa previstas na Lei Complementar Federal nº 95/1998 e no Decreto Federal nº 12.002/2024. Normas sobre a forma de alteração de artigos, o uso de linhas pontilhadas para indicar dispositivos não alterados e a proibição da expressão genérica “revogam-se as disposições em contrário” foram ignoradas. Essas falhas, embora pareçam menores, comprometem a clareza, a segurança jurídica e a organicidade do ordenamento legal.
Consequências do Veto para Santa Luzia
O veto total à Proposição de Lei nº 079/2025 impede que o município avance com a exploração de sua própria loteria neste momento, pelo menos sob os termos propostos. A decisão do Prefeito reflete uma preocupação com a estabilidade jurídica e com o uso correto dos recursos públicos, evitando que Santa Luzia se envolva em um litígio futuro ou em um empreendimento que careça de base legal sólida.
Enquanto a ADPF nº 1212 não for julgada definitivamente pelo STF, a exploração de loterias por municípios continuará sendo uma área de grande incerteza. A Mute TV continuará acompanhando de perto esse e outros desdobramentos que impactam diretamente a vida dos cidadãos de Santa Luzia, trazendo informação clara e relevante para todos.
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